Operador de Barjas, braço direito de Serra, não se arriscaria tanto pelo silêncio dos Vedoin se não houvesse nada comprometedor
Nas últimas semanas do mês de agosto, a cidade de Cui-abá recebeu uma visita algo insólita. O empresário Abel Pereira, de Piracicaba, hospedou-se no apartamento 417 do hotel Taiamã. De lá, comunicou-se várias ve-zes com os donos do grupo Planam e princi-pais envolvidos no escândalo das ambulân-cias, Darci e Luís Antonio Vedoin. Alguns dias depois, ainda em agosto, o mesmo Abel Pereira voltava a Cuiabá. Repe-tiu o que fizera na visita anterior, e suas comuni-cações com os Vedoin foram registradas pela Polícia Federal, que esta-va monitorando os tele-fonemas destes.
RISCO
O que havia de insólito nas visitas e na conduta de Abel Pereira não é difícil de perceber: por que um milionário, cuja família é proprietária de 11 empresas que vão muito bem de vida, e que até então não havia sido mencionado nos jornais, revistas ou TV, viajaria a Cuiabá para manter contato com dois réus que estavam no centro de um escândalo que ocu-pava todos os jornais, revistas e noticiários televisivos? Obviamente, para quase todos os empresários do país, a companhia dos Vedoin era algo pior do que a companhia da lepra. Queriam vê-los longe, até porque não tinham nada a ver com seus mal-ajambrados negócios. No entanto, alguma coisa fez Abel achar que valia a pena correr o risco de chamar a atenção da polícia para a sua pessoa – ou, talvez, ele não tivesse outra alternativa.
Somente no dia 15 de setembro, com a publi-cação da entrevista dos Vedoin na "IstoÉ", é que se soube que o hóspede do apartamento 417 do hotel Taiamã era, além de milionário e dono de empresas em Piracicaba, o operador de Barjas Negri, braço direito e sucessor de Serra no Ministério da Saúde. Barjas é, há muito tem-po, a pessoa mais pró-xima de Serra, persona-lidade que, sabidamente, não tem muitas pessoas próximas. Barjas, hoje guindado à prefeitura de Piracicaba, nunca teve na política o que se cha-ma luz própria – sempre foi considerado não mais que um homem de Serra.
Quanto a Abel, era através dele, segundo o relato dos Vedoin, que as verbas para a compra de ambulâncias eram libe-radas, evidentemente com um pedágio sobre o valor desses recursos.
LEILÃO
Assim, não era estra-nho que Abel estivesse em Cuiabá no final de agosto. Segundo agentes da PF ouvidos pela "IstoÉ", Abel Pereira foi a Cuiabá oferecer R$ 4 milhões aos Vedoin para que não entregassem à Justiça os documentos que provavam a ligação com ele e Barjas. E, re-almente, apenas no dia 13 de setembro, um dia antes de concederem entrevista à revista "Is-toÉ", esses documentos foram protocolados na Justiça federal.
Porém, desde a pri-meira quinzena de agos-to, segundo a própria imprensa, os Vedoin fa-lavam em entregar nova documentação à Justiça e à CPI. A revista "Épo-ca", em especial, regis-trou o fato, numa maté-ria em que, por alguma razão, tratava de deses-timular essa entrega, levantando que ela poderia provocar a revo-gação da "delação pre-miada" pela qual os Ve-doin permaneciam fora da cadeia.
Logo depois disso, na segunda quinzena de agosto, Abel Pereira aparece duas vezes em Cuiabá e contacta com os Vedoin. Sobre isso, um agente da PF disse à "IstoÉ" que "os Vedoin fizeram um verdadeiro leilão com as informações que têm".
Seja como for, Abel não iria se arriscar a ser envolvido publicamente com os Vedoin – como acabou acontecendo – se essas informações não fossem verdadeiras e comprometedoras. Aliás, é significativo que ele não tenha enviado um inter-mediário. Provavelme-nte, o que estava em risco era importante demais para que ele confiasse em um pre-posto. Ou, mais precisa-mente, Abel e os que estavam por trás dele sa-biam que os Vedoin não aceitariam um pre-posto, pela simples razão de que já o consideravam um preposto.
PREPOSTO
É exatamente, aliás, o que os Vedoin disseram a "IstoÉ", na entrevista feita em setembro, por-tanto, depois das tra-tativas com Abel, que fo-ram nas últimas semanas de agosto. Literalmente:
ISTOÉ – Quem é Abel Pereira?
Luiz Antônio – É um empresário de Piracicaba que ope-rava dentro do Mi-nistério da Saúde para nós. Era ele quem conduzia todo o processo e fazia sair todos os em-penhos... Era um operador, uma pes-soa indicada e mui-to ligada ao Barjas Negri, secretário executivo do Minis-tério quando José Serra era o minis-tro e seu sucessor.
Darci – O Bar-jas Negri é o braço direito do José Ser-ra. Nosso esquema já funcionava no Ministério. Quando o Serra saiu, o Bar-jas assumiu o Mi-nistério e foi indi-cado o Abel para continuar a operar.
Portanto, em relação aos Vedoin, Abel sempre foi um preposto, assim era conhecido e assim se apresentava. Os Vedoin não iriam negociar com o preposto de um prepos-to. Daí a necessidade do próprio Abel ir a Cuiabá.
Estabelecida a sua condição de preposto, a questão é: em nome de quem Abel ofereceu R$ 4 milhões para que os Vedoin ficassem calados e não entregassem a documentação à Justiça? Em outras palavras: Abel era preposto de quem, quando foi a Cuiabá começar esse leilão de documentos e provas?
Ou, usando o velho princípio do Direito Ro-mano: a quem benefi-ciaria nesse momento o silêncio dos Vedoin? Quem sairia prejudicado se todas as provas que estavam com os Vedoin fossem divulga-das naquele momento? Que acontecimento era tão importante que Abel e seus mentores arrisca-ram tanto para que não fosse influenciado pela divul-gação dessas provas?
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